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Ramiro Batista

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Vamos falar sobre Kevin, internet e nossa incapacidade de indignar

31 de dezembro de 2012 por Ramiro Batista Deixe um comentário

Tilda Swinton e a culpa infinita de não ter percebido a tempo os cálculos do filho

No meu tempo de redação, dizia-se que a dor da gente não saía no jornal para traduzir com poesia a frieza das manchetes. Depois, com a velocidade da TV que tornava os jornais já velhos logo de manhã, dizia-se que ela sequer durava o tempo de o jornal virar embrulho de peixe. Com os sites hoje, a notícia piscando quase que simultaneamente ao fato, parece que nem dá para sentir dor. Ou que a dor dura cada vez menos, saltando em poucas horas da primeira para a quinta linha, do primeiro para o último banner de destaque.

O massacre de 20 crianças e seis adultos numa escola da cidadezinha de Connecticut, numa sexta-feira antes do Natal, já tinha saltado para as linhas inferiores dos sites de notícias no sábado e quase desaparecido no domingo. Só o resultado da autópsia que liberou alguns retratinhos 3×4 das vítimas esquentaram um pouco o noticiário naquele dia, lá pela quinta linha.

Por metade disso, em 1999, jornais e revistas encheram por dias suas páginas com esse retratinhos, panorâmicas de corpos espalhados, quadros bíblicos de rostos desesperados, mapas, infográficos, extensos relatos pessoais e análises. No que é considerado o evento inaugural desse tipo de massacre em massa, dois jovens mataram 12 estudantes e uma professora na escola Columbine, no Colorado, e se suicidaram em seguida.

À medida porém que, por imitação, esses ataques foram se tornando comuns e o número de vítimas foi se ampliando, o espaço nas páginas foi se reduzindo, a posição no topo dos sites perdendo prestígio e a análise desaparecendo, até chegarmos a um mínimo de páginas nas revistas (a Veja deu três na semana do episódio) e à transitoriedade dos pulsos eletrônicos.

Com o tempo, eventos desse tipo vão merecer apenas uma nota nas páginas policiais ou nas colunas de obituários das revistas, a exemplo do que aconteceu com as enchentes, as chacinas e os acidentes de trânsito. Os grandes acidentes de avião, com mais de 100 passageiros, ainda resistem na prioridade dos editores. Será preciso que passem de certa média anual, que os tornem algo inscrito no plano das estatísticas, para que também sejam remetidos para as colunas de notas.

A dor da gente que não saía no jornal e que hoje não sai no site diminuiu? No grande liquidificador da internet que tudo tritura e dilui numa velocidade espantosa, perdemos em 2012 mais um pouco de nossa percepção das tragédias, de nossa solidariedade com o sofrimento da humanidade e de nossa capacidade de indignar?

Talvez, não. Talvez estejamos deixando de mediar nossas vidas ou medir o pulso do que vai pelo mundo por jornais, revistas e sites de  notícias. E estejamos indo carpir nossas dores em fontes mais variadas, como as redes sociais que ampliaram planetariamente o sentido de cumplicidade ao pé do ouvido ou em tanto livro e em tanto filme bom à disposição.

Um tanto insatisfeito com o noticiário curto e no eterno prazer de sofrer que tanto me diverte, fui rever Precisamos Falar Sobre Kevin, baseado no livro Lion Shriver, um tratado que nem capas e centenas de páginas de sites, jornais e revistas poderiam traduzir. Uma mãe (Tilda Swinton, magistral) devastada por pesadelos diurnos e noturnos tenta reconstruir a vida e expiar a culpa de não ter entendido – a tempo de evitar – os passos calculados do filho problema que acabou trancando os colegas num ginásio para disparar contra eles com tempo e prazer.

Tudo o que se pode dizer sobre esse tipo de psicopatia, de indivíduos isolados, frios, tão inteligentes quanto desprovidos de sentimento, está no olhar sem compaixão do jovem ator Ezra Miller. Tudo o que se pode inferir de um ambiente familiar complicado, de pai protetor e mãe acuada demais para ter coragem de impor limites, está no clima de bomba relógio que a diretora Linny Ramsay vai construindo par e passo até o desfecho inevitável. Ou até o diálogo silencioso com que a mãe tenta enfrentar o filho, pelo menos uma única vez, na visita que lhe faz no presídio depois do massacre.

– Por quê? – ela arranca do fundo da garganta.

– Hoje, nem eu sei – é só o que ele responde.

Essa dor de quem viveu a tragédia por dentro, na frente ou atrás da mira do revólver, infinita, sobreviverá independente dos jornais, das revistas, das manchetes pulsando nos sites e da reação que possa ter qualquer homem de boa vontade, diante de um mouse, nos cinco continentes, em busca da mesma resposta:

– Por quê?

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Sobre Ramiro Batista

Sou escritor e jornalista formado em Letras e Literatura, Comunicação e Marketing, experiente em escrever, editar, publicar, engajar e promover pessoas e ideias. Compartilho tudo o que sei sobre o uso de ferramentas de comunicação para conquistar e manter poder.

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